Pesca e caça indígenas

No auge do verão, entre julho e setembro, os rios ficam bastante secos, facilitando a pesca. Com o campo seco no auge do verão, encontram-se com facilidade por toda a região os ninhos com os ovos, muito apreciados, de tracajá, jacaré e camaleão. No inverno as chuvas fazem o rio transbordar, tornando a pesca mais difícil. Nesse período caça-se mais, e o cuidado com as roças de mandioca é basicamente o de limpeza e manutenção. Ao longo do ano inteiro, não se pode dizer que haja exclusividade desta ou daquela atividade: normalmente, caça, pesca e coleta estão associadas entre si.

A caça é uma atividade muito valorizada entre os povos da região, e seus produtos são responsáveis pelo principal aporte proteico. Das espécies mais caçadas, destacam- se, dentre os mamíferos, antas, porcos-do-mato, veados, preguiças e macacos, especialmente o coatá, ou coamba; dentre os roedores, paca e cutia; dentre as aves, mutuns, araras, jacamins, tucanos, nambus, jacus e outras; dentre os répteis, jacarés e diversas espécies de quelônios. Para caçar, em geral usam-se espingardas. A adoção das armas de fogo fez com que o arco e a flecha passassem a ser raramente utilizados, a não ser pelas crianças, adolescentes e alguns homens mais idosos.

Se a caça é uma atividade exclusivamente masculina, a pesca, contrariamente, é realizada tanto pelos homens quanto pelas mulheres, que usam técnicas diferentes: as mulheres pescam com anzóis pequenos, à beira de lagoas próximas às aldeias ou acampamentos; os homens, na estação propícia, realizam expedições mais distantes, em que usam anzóis e tarrafas; no verão, as aldeias se reúnem para pescarias coletivas, quando em vários grupos, como entre os Aparai, Wayana, Zo’é e Wajãpi, usa-se timbó, sendo o trairão uma das espécies mais valorizadas.

Além da caça, outras atividades, em geral, exclusivamente masculinas são a derrubada, queimada e limpeza de roças e de novos assentamentos, construção de casas, e a produção de toda a parafernália doméstica em cestaria (abanos, cestos e recipientes, tipiti etc.). As mulheres são responsáveis pelo aprisionamento da água e do fogo, o preparo dos alimentos, o processamento de tubérculos para a produção de farinha, beiju e bebidas fermentadas, além de toda a produção em cerâmica (panelas e fornos para torrar beiju e farinha) e algodão (redes, tipóias, etc.). A ambos os sexos cabem as atividades de coleta, plantio e colheita dos produtos da roça e as grandes pescarias realizadas com timbó durante a estação seca. Durante o ano todo, são realizadas incursões na floresta para a caça e a coleta. A coleta é praticada com a mesma intensidade, complementando a dieta alimentar. Essas incursões mobilizam o casal ou, mais frequentemente, grupos de irmãos, de cunhados ou de pai e filhos. Nelas são obtidos: mel silvestre, açaí e bacaba, larvas de insetos, ovos de tracajá (nas praias, durante a estação seca), arumã para a confecção de cestaria, resinas vegetais, barro e argila para a produção de cerâmica e de tinturas minerais etc.

Em geral, pode-se dizer que, na região como um todo, nenhuma família indígena obtém ou produz os elementos necessários à sua manutenção e os recursos monetários de que necessita através de uma única atividade, mas através da conjugação da quase totalidade delas. Apesar de estarem engajados há muitos anos num processo que conjuga a diversificação de sua atividade produtiva e a aquisição e uso cotidiano de alguns bens industrializados, o padrão de consumo familiar dos povos indígenas da região tem se mantido estável. A produção de subsistência, principalmente na agricultura, somada à caça, à pesca, e à coleta, continua suprindo as necessidades das comunidades. A fartura alimentar gerada pelas produções locais resulta de um padrão cultural que garante – na produção agrícola – uma produção acima das necessidades, excluindo qualquer possibilidade de escassez. No que toca à caça, sua obtenção se tornou mais difícil nas imediações de aldeias já com muitos anos de existência, mas que não podem ser desativadas por abrigarem postos de assistência.

Pesca e caça indígenas
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This article was written by:

José Maurílio Soares Soares

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