SOCIEDADES

Uma História da Evolução Cultural A idéia de um padrão para a evolução cultural foi bastante divulgada pelos teóricos sociais do final do século 19, especialmente Morgan (1877), Tylor (1871), Spencer   e   Maine   (1870).   Todos   eles   correlacionavam   evolução   com   progresso,   de piores condições sociais para melhores; acreditavam que as novas tecnologias e novas idéias que surgiam, progressivamente libertavam o Homem de sua condição animal. Morgan – com seus estágios sucessivos de Selvageria, Barbárie e Civilização – entendia que os desejos biológicos primários de fome e sexo teriam sido superados pelos avanços culturais. Maine viu a emergência das leis como a libertação do indivíduo da tirania da família. No entanto, não seria correto ver os evolucionistas do século 19 de uma forma tão simplificada. Engels (1884) percebeu como a ambição individual poderia resultar em   um   fenômeno   tão   dramático   como   a   escravidão;   Spencer   percebeu   como   o desenvolvimento cultural baseado na competição e na guerra resultou muito mais em opressão do que em libertação e Malthus (1798) já havia percebido que o crescimento populacional não levaria ao progresso mas à miséria e à morte. No   início   do   século   20,   reagindo   especialmente   às   idéias   etnocêntricas   de progresso,     Franz   Boas   (1920)   e   seus   colaboradores   Lowie,   Kroeber   e   Benedict rejeitaram   a   evolução   cultural.   Para   eles,   cada   cultura   era   única   e   deveria   ser compreendida em sua especificidade; se ela muda, muda de maneira única a ela própria e nenhuma generalização entre culturas poderia ser feita. Essa   abordagem,   no   entanto,   foi   desacreditada   pela   grande   quantidade   de evidências   arqueológicas   e   etnográficas   corroborando   uma   evolução   cultural.   A “evolução unilinear” de Leslie White (1959) resgatou a fé evolucionista do século 19 no progresso como um crescimento cumulativo do domínio do Homem sobre a natureza, no sentido de que aquele passava cada vez mais a aumentar seu controle sobre fontes de energia (luz solar, carvão, petróleo, átomos), a fim de satisfazer seus objetivos. Mas a teoria proposta por White era demasiada abstrata. Não havia meios de confirmação empírica. Foi um antropólogo mais empírico, Julian Steward (1955), que questionou a idéia de uma evolução simples, unilinear. Ele percebeu a evolução cultural como se desenvolvendo ao longo de várias linhas distintas, dependendo dos contextos ecológicos e históricos locais, um padrão ao qual chamou de “evolução multilinear”. A abordagem de   Steward   serviu   de estímulo   para   que   as   pesquisas   etnográficas   e   arqueológicas passassem a ter uma orientação ecológica, a partir dos anos 60 e 70. Etnógrafos como Rappaport (1967) e Netting (1968, 1977) procuraram entender como certos aspectos específicos da cultura (práticas de subsistência, organização social, ciclos de rituais)
SOCIEDADES
A   captação   de   recursos   é,   geralmente,   organizada   de   forma   a acompanhar   a   sazonalidade   do   meio,   com   a   aldeia   em   certos   momentos   se fragmentando em unidades menores e, em outros, voltando a assumir importância como centro.   A   aldeia   não   forma   uma   estrutura   política   clara   e   a liderança   ainda   é   um elemento que depende do contexto e especificidade da situação. Os rituais religiosos ainda   são   pouco   elaborados,   a   guerra   não   é   comum   e   a   territorialidade   é   quase inexistente. O Grupo Local. Grupos congregando muitas unidades familiares, cerca de 5 a dez vezes maior que o grupo familiar, integradas por algum tipo de interesse comum, como por exemplo a necessidade de defesa ou a estocagem de alimentos. Geralmente estão divididos, por parentesco, em linhagens ou clãs. A estrutura política dos grupos locais   pode   variar   entre   comunidades   aldeãs   acéfalas   (sem   liderança   e   controle)   e comunidades lideradas por um personagem central, que assume uma liderança explícita, conhecido como Big Man. Nas   comunidades   acéfalas,   a   economia   se   centra   em   plantas   e   animais domesticados. O tipo mais comum de assentamento é a aldeia, com cerca de 100 a 200 pessoas,   divididas   em   clãs   ou   linhagens   (25   a   35   pessoas).   Formam   um   grupo politicamente   integrado   através,   principalmente,   da   religião   e   dos   seus   rituais.   As cerimônias religio sas e rituais são o elemento mais importante para definir as relações entre os clãs e entre grupos locais. Nas comunidades lideradas pelo Big Man é caracterizada por sociedades aldeãs formadas por múltiplos clãs e baseada essencialmente em produtos domésticos. O Big Man é um líder de grande carisma  e é essencial para a manutenção da coesão interna do grupo   e   fundamental   como   negociador   de   alianças   com   outros   grupos.   Ele   é   o representante   do   grupo   nos   aspectos   religiosos   e   cerimoniais.   Seu   poder,   contudo, depende de sua própria iniciativa pessoal, de seu carisma; uma vez que o grupo se volta a outro líder rival, seu poder e prestígio desaparecem. A Política Regional. As organizações regionais surgem a partir da fragmentação de grupos locais. Dependendo do grau de integração econômica e política, poderão se formar chefaturas ou estados. As chefaturas se desenvolvem em sociedades onde os conflitos parecem ser endêmicos   e   evoluem   para   a   necessidade   de   conquista   e   incorporação   de   novos territórios. As estratégias econômicas associadas às chefaturas, tais como sistemas de irrigação e comércio de larga escala, fornecem as oportunidades para que uma elite invista no crescimento e no controle dessas atividades, o que fará gerar excedentes que por sua vez sustentarão e financiarão os objetivos dessa elite. A medida em que a integração regional cresce, cargos de liderança surgem em nível local e regional, sendo ocupados por membros dessa elite, através da ratificação da linhagem hereditária. 8 Sempre em busca de novas fontes de poder, as lideranças buscam expandir seus domínios e controle territorial através da conquista. Nessas sociedades, a competição é intensa, tanto dentro da chefatura pela busca de poder quanto entre chefaturas, pelo controle de territórios e recursos. A religião e seus rituais têm como função legitimar  a liderança e o controle da sociedade pela elite governante. O   desenvolvimento   de   estados   e   impérios   envolve   a   extensão   do   domínio político, geralmente através de conquista, de regiões ainda maiores. Estados formados por conquista incorporam vastas populações, geralmente na casa de milhões de pessoas, que   são   étnica   e   economicamente   distintas.   Como   nas   chefaturas,   as   elites cuidadosamente gerenciam a economia a fim de maximizar o excedente que será, por sua vez, transformado em poder político. A propriedade dos recursos e da tecnologia pelas elites é tipicamente formalizada por um sistema legal; instituições regionais e nacionais são desenvolvidas, tais como exército, uma burocracia, uma legislação, a fim de manter o funcionamento e o controle sobre a sociedade. A religião é usada para legitimar o poder e a desigualdade social. 
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Abel Borges

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